quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Chico Maranhão - Lances de agora (1978)


Chico Maranhão - Lances de agora (1978)

1. Meu samba choro
2. Lances de agora
3. Ponto de fuga
4. Cirano
5. Mulher
6. Frevo do barulho
7. Boi, meu menino
8. Velho amigo poeta
9. Ponta de areia
10. Vassorinha meaçaba
11. Pastorinha

“Este disco tem uma história que começou há 11 anos. Em 1967, conheci Francisco Fuzzeti Viveiros Filho – nome usado unicamente para guardas de trânsito e delegados, com os quais ele não permitia a intimidade de seu verdadeiro nome – Maranhão – exclusivo para seus amigos. Conheci também seu talento, que não era apenas grande e raro, era espantoso. Editei com ele um disco-brinde em 1969. O brinde era, então, a desculpa que eu tinha para gravar discos. Na sua contra-capa escrevi: “Atentem para ‘Cirano’, cuja letra
magistral nos dá uma medida das possibilidades do compositor e – através dele – das possibilidades inexploradas da nossa poesia-música popular, que muitos consideram em impasse”.

Esse primeiro disco apresentava, no lado A, músicas de Maranhão e, no lado B, de Renato Teixeira. Em 1971, gravei o segundo disco-brinde com músicas de Maranhão. Transcrevo sua contra-capa.

“Entre os “novíssimos” da música popular brasileira da primeira metade da década de 60 – como Chico Buarque, Caetano, Edu, Gil e outros – Maranhão tem um lugar de indiscutível destaque. Inovador, como poucos, nos seus temas, na estrutura literária de suas letras, no ritmo e na divisão de suas composições, se reconhece a marca do líder e não do participante de tendências.

Este disco tem uma missão maior do que, simplesmente, entreter: a de documentar o surpreendente nível de uma face particular de nossa cultura, a música popular.”
“Acontece que a terra de Maranhão é a cidade de São Luís, onde ninguém nasce e vive impunemente.”

Maranhão é arquiteto e formou-se na turma que Chico Buarque abandonou. Maranhão abandonou, depois, sua equivocada carreira, e foi morar na sua terra, o que todos os exilados fariam se pudessem. Acontece que a terra de Maranhão é a cidade de São Luís, onde ninguém nasce e vive impunemente. E Maranhão paga a pena privilegiada de viver e testemunhar a cultura popular regional mais marcante e intacta do Brasil.

Este disco, o octogésimo segundo do selo “Marcus Pereira”, marca o início de uma nova fase de seu trabalho iniciado em 1967, com onze sambas e uma capoeira, que reúne músicas de Paulo Vanzolini, e Brasil, flauta, cavaquinho e violão, que marca o ressurgimento do choro. Esta nova fase tem como intenção principal gravar “in loco” as manifestações artísticas do povo brasileiro, com dois objetivos:

- O primeiro, viabilizar registros que, de outra forma, não poderiam ser feitos.

- O segundo, incorporar a autenticidade, a espontaneidade e a interpretação que o artista só alcança no seu meio, na sua terra, junto a sua gente.

O equipamento de registro, ainda que profissional, evidentemente não possui os mesmos recursos dos equipamentos de estúdio. Entretanto, esta muito relativa inferioridade é largamente compensada pela verdade que o registro incorpora, pela participação de músicos de São Luís, familiarizados com o repertório e inspirados pela brisa da baia de São Marcos que chegam depois de um pouso restaurador na velha cidade de Alcântara, onde seus velhos fantasmas lhe ficam acenando.

“Ocorre que o impasse não é da música, é um falso impasse usado para mascarar as omissões, as cumplicidades, os interesses e as deserções.”

Mais de 10 anos depois, reencontro-me com o talento de Maranhão. As previsões feitas foram superadas, porque Maranhão superou-se. O famoso impasse da música popular brasileira cristalizou-se, hoje é lugar comum. Ocorre que o impasse não é da música, é um falso impasse usado para mascarar as omissões, as cumplicidades, os interesses e as deserções. Neste reencontro tenho por testemunha o companheiro Marcus Vinícius, a cujo talento múltiplo de músico, produtor e técnico todos devemos este disco gravado na sacristia da Igreja do Desterro, em São Luís, lugar de meditações e prece, incorporadas pela magia dos microfones a este disco.

“E, também, ninguém consegue dimensionar as possibilidades do
talento de nosso povo, que sobrevive nas festas populares…”

Este disco merece um seminário para debate e penitência. Ele me fez superar o espanto do primeiro encontro com Maranhão para um espanto maior. Do ponto de vista musical e literário, reúne 11 obras insuperáveis, mas já me preparo para contradizer-me mais tarde, ninguém consegue dimensionar as possibilidades do espírito humano. E, também, ninguém consegue dimensionar as possibilidades do talento de nosso povo, que sobrevive nas festas populares, na procissão que reúne 500 mil pessoas, em Belém, na festa do Círio de Nazaré, nas vielas da Madre Deus e na sacristia da Igreja do Desterro, em São Luís do Maranhão, santificada também pela sua resistência. Seus canhões, que antes bombardeavam os invasores, lançam hoje petardos poderosíssimos de talento, de beleza e de brasilidade.”

MARCUS PEREIRA


2 comentários:

  1. victor hugo: http://twitter.com/zemaribeiro/status/27950166848

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  2. Tem como repostar os links que estão fora do ar? Muito obrigado! Parabéns pelo site.

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